segunda-feira, 2 de maio de 2016

Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (Análise)

A análise do filme Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge (The Dark Knight Rises, Christopher Nolan, 2012, EUA, 165 min.) foi feita por Rodrigo Hilário Barbosa.
É bastante importante ressaltarmos que a análise do filme contém spoilers, ou seja, se você não assistiu ao filme ficará ciente das cenas que acontecerão durante a produção e poderá estragar as surpresas. Recomendamos ler apenas se você já assistiu ao filme e gostaria de ter uma visão mais aprofundada.

Ficha Técnica

Direção: Christopher Nolan
Produção: Warner Bros. Pictures, Legendary, DC Comics, Syncopy.
Roteiro: Christopher Nolan e Jonathan Nolan.
Fotografia: Wally Pfister
Música/Trilha Sonora: Hans Zimmer

Sinopse

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8 anos se passaram desde que Batman desapareceu na noite em passou de herói para fugitivo ao assumir a culpa pela morte do policial Harvey Dent. O Cavaleiro das Trevas sacrificou tudo pelo que ele e o Comissário Gordon esperavam ser o melhor. Por um tempo a mentira funcionou, com a criminalidade em Gotham City sendo destruída pela lei anti-crime de Dent. Mas tudo irá mudarcom o aparecimento de Bane, um terrorista mascarado que tem planos cruéis para Gotham. Bruce Wayne veste novamente seu capuz e sua capa, porém Batman pode não ser páreo para Bane.
Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge - Análise

Contextualização

Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge é o último filme da trilogia Batman dirigida por Christopher Nolan, diretor responsável também por outras grandes produções como A Origem e Amnésia. Nolan já recebeu três indicações ao Oscar. O Cavaleiro das Trevas Ressurge foi produzido integralmente por incentivo privado de grandes produtoras de Hollywood como Warner Bros Company.

Análise

Batman – O Cavaleiro das Trevas é um filme que nos traz uma analogia muito grande e intensa sobre as necessidades sociais da atualidade. Independente do posicionamento político que Christopher Nolan nos proponha ao final de seu filme, é inegável que este nos faz pensar a respeito de mudanças.
Várias analogias nos são apresentadas com o desenlace do filme. A primeira que deve ser reparada é a cidade de Gotham que faz referência à Nova Iorque, coração de um sistema socioeconômico global e uma grande referência ao se falar de desigualdades sociais. Uma cidade que movimenta uma quantidade gigantesca de dinheiro e ao mesmo tempo abriga uma enorme população que vive na pobreza. A meu ver, duas questões são colocadas à discussão no filme.
  1. Até que ponto o financiamento que o capitalismo selvagem oferece à criminalidade, visando maiores lucros de formas ilegais, continuará o sustentando sem fazer que esta mesma criminalidade passe a exercer um controle sobre ele, provocando uma inversão no sistema?
  2. Até quando ou até que ponto a sociedade suportará ser explorada e degradada por este sistema selvagem?
Dois modos de mudanças sociais nos são apresentados no filme. O primeiro é o do vilão Bane, um terrorista/mercenário, novo líder da Liga das Sombras, sucessor de Ra´s Al Ghul que foi o mentor de Batman. Esta instituição, a Liga das Sombras, de caráter revolucionário, visa destruir o sistema opressor em Gotham City. O segundo é o próprio Bruce Wayne/Batman, que tenta uma mudança de um modo mais pacífico, concentrando suas forças nas ações corruptas e criminosas da cidade. Bane representa a sociedade oprimida. Cresceu em uma prisão isolada da civilização por um “crime” que não se sabe se houve julgamento ou não. Mas sua representação maior está em seu anseio. Bane busca, em toda sua estada nesta prisão, emergir, crescer, rises, como no título do filme (palavra que será usada mais vezes em outras analogias). Este anseio é frequente numa sociedade onde o dinheiro dita as regras e a população que nasce em meio à pobreza precisa emergir todos os dias da escuridão que lhes é imposta no momento de seu nascimento. Assim como Bane cresce na escuridão da prisão e de lá tem de emergir, a população pobre precisa emergir de uma escuridão social.
As características de Bane no filme também são de grande importância. A começar por seu próprio nome que significa ruína, a destruição, a desgraça, ou seja, a destruição de uma sociedade corrompida. Em seguida devemos fazer grande referência à sua voz. A primeira reação ao ouvir a voz de Bane é segurar-se na poltrona do cinema, no sofá da sala ou segurar-se no que estiver por perto, pois ela causa uma sensação de pânico, medo e foi criada exatamente com este propósito, visando mostrar o que Bane causaria na sociedade.
Outra característica importante é a força de Bane, mostrando como seu anseio pela destruição do sistema permitiu que ele emergisse e se tornasse cada vez mais forte. Bruce Wayne, por outro lado, representa a parte rica da sociedade, o “príncipe” de Gotham (como usado no primeiro filme).
Bruce na figura/símbolo de Batman lutará contra a criminalidade na cidade e buscará com sua fortuna, investir em projetos sociais e projetos de sustentabilidade, buscando restaurar o equilíbrio da sociedade sem uma quebra brusca com o sistema atual movido pelo dinheiro. Ele busca, portanto, a instauração de um capitalismo social, onde quem detém grande parte do dinheiro terá um pensamento social e buscará ajudar pessoas mais necessitadas.
O filme apresenta também vários encontros que mostram as disparidades sociais ou ideológicas em ação. O primeiro momento é o encontro entre Miranda Tate (empresária que investe em energia limpa) e John Dagget (empresário ganancioso que visa seu lucro a qualquer custo). Neste momento o capitalismo selvagem se encontra com o capitalismo social.
Um segundo encontro de grande importância nas analogias do filme é o da ladra Selina Kyle (Mulher-Gato) e o deputado Gillian. Neste momento é mostrado como as forças do Estado, que deveriam ser estritamente fiéis às leis e à sociedade, estão estritamente envolvidas com a criminalidade.
Selina Kyle representa também a massa pobre e oprimida que optou pelo caminho do crime como modo de sobrevivência. O debate sobre esta atitude ser certa ou errada e suas influências na cabem à esta análise. Mas vale notar como as consequências do sistema opressor estão a todo o momento se entrelaçando.O encontro entre Mulher Gato e Stryver (vice-presidente das indústrias Dagget) nos apresenta a relação estreita entre a criminalidade e seu financiamento pelas grandes corporações. Esta relação aparece também em relação a Bane, que tem toda sua revolução financiada pelas grandes corporações sem que estas percebam.
A mesma falta de oportunidade que leva Selina para o crime leva também o jovem Jimmy, órfão e ex-morador de um orfanato, a buscar trabalho no subterrâneo da cidade e acabou morrendo. Devese notar aqui que o uso do subterrâneo não é à toa. Este é usado para mostrar que a sociedade oprimida e sem oportunidades é colocada cada vez mais no fundo do sistema, sendo sempre massacrada por quem vem de cima.
O mesmo esgoto abriga a Liga das Sombras, grupo terrorista/criminoso liderado por Bane. Mais uma vez mostra-se uma parcela da população que vive ao fundo do sistema. Porém é a aprtir deste fundo que eles emergirão (Rises). Outro encontro que nos propõe certa analogia é entre Selina Kyle (a pobreza e o crime) e Bruce Wayne (a riqueza e a prosperidade) num baile de gala. Um aviso de Selina sobre algo que está para acontecer vem seguido de uma frase muito impactante e que propõe uma reflexão social imensa.
- “Uma tempestade está por vir. E quando ela chegar, vocês irão se perguntar como puderam viver com tanto deixando tão pouco para o resto de nós”.
Em seguida Bane inicia uma série de ataques brutais visando destruir todo o sistema e o que ele acredita serem seus pilares principais, o sistema financeiro e o Estado. O primeiro destes ataques acontece no coração do sistema financeiro, a Bolsa de Valores de Gotham City (que representa Wall Street). Vale ressaltar também que antes dos ataques começarem, os mercenários de Bane estão disfarçados de trabalhadores pobres e recebem um tratamento repugnante das pessoas que fazem parte da Bolsa de Valores, mostrando como a camada considerada baixa, economicamente falando, é tratada no cotidiano.Neste momento o sistema financeiro começa a entrar em colapso, pois a mesma organização que ele financiava iniciou ataques contra eles.
Posteriormente ocorre uma cena de extrema importância para o entendimento da crítica social do filme. Bane (crime) e Daggett (capitalismo selvagem e financiador da criminalidade) se encontram. Daggett mostra-se insatisfeito, pois o ataque à Bolsa de Valores financiado por ele não obteve o sucesso esperado. A partir daí um diálogo de extrema importância ocorre.
– Daggett: “Eu estou no comando!”
– Bane: “Você se sente no comando?”
– Daggett: “Eu paguei uma pequena fortuna à vocês.”
– Bane: “E isso lhe dá poder sobre mim? O seu dinheiro e sua infraestrutura foram importantes até agora!”
– Daggett: “Quem é você?!”
– Bane: “ O acerto de contas de Gotham!”
– Daggett: “Você é o mal!”
– Bane: “Eu sou um mal necessário”
Durante a cena, Bane é enquadrado de maneira que lhe mostre muito superior à Daggett, muito mais alto, ou seja, muito mais poderoso do que Daggett. Ele também posiciona sua mão sobre o ombro de Daggett, mostrando que neste momento a criminalidade exerce grande dominação sobre o sistema financeiro que a sustentava. Em seguida Bane mata Daggett, o que representa o colapso final do sistema financeiro.
Bane e Batman/Bruce Wayne finalmente se encontram. Os meios de mudança estão frente a frente enfrentando-se tanto fisicamente quanto ideologicamente. Num primeiro momento Batman é derrotado e é lançado na mesma prisão onde Bane cresceu. Este será o lugar em que Batman deverá aprender a se levantar (Rises) em meio à escuridão. Os ataques de Bane ao sistema continuam. Dessa vez o Estado é o alvo. A cena mostra a tomada do poder pelo caos. A cena no estádio mostra toda a glória do sistema sendo cantada ao hino dos EUA, enquanto a queda e destruição de toda essa glória são armadas.
A explosão de todo o subterrâneo da cidade coloca todos os policiais (representantes e seguradores da “ordem” e da lei) no subterrâneo, enquanto Bane e seus mercenários emergem ao poder (Rises). Essa inversão definitivamente mostra a ascensão do caos ao poder enquanto todo o sistema está definitivamente quebrado em seus pilares principais e trancafiado no subterrâneo antes habitado pela escória da sociedade. O discurso de Bane mostra parte de seu interesse por Gotham:
– “Gotham, recupere o controle de sua cidade”
– “ Este é o instrumento de sua libertação”
– “Mas não viemos aqui como conquistadores, mas sim como libertadores. Viemos aqui para devolver o poder da cidade ao povo!”
– “ Amanhã vocês irão reivindicar o que é de vocês por direito”
A cena e o discurso mostram como deve ser a quebra do sistema, por meio do caos. Mostra também que o controle, o poder, devem ser entregues de volta ao povo. Porém, aparentemente Gotham servirá apenas como exemplo, já que uma bomba está em contagem regressiva para literalmente explodir a cidade que é o coração do sistema opressor, tornando a liberdade que Bane propõe ao povo de Gotham, uma liberdade falsa já que tem prazo de validade. A libertação dos prisioneiros de Black Gate vem acompanhada de outro discurso de Bane onde o sistema político/estatal vai sendo desmascarado e o símbolo de justiça, Harvey Dent, é quebrado:
– “ Vocês receberam um falso ídolo para que fossem impedidos de destruir essa cidade corrupta”
– “ E vocês aceitam a demissão deste homem?! (O homem citado é o comissário Gordon que omitiu os crimes de Harvey Dent para que o ato Dent fosse sustentado). E aceitam a demissão de todos esses mentirosos?! Desses corruptos?! (…)Vamos tomar Gotham das mãos dos corruptos, dos ricos, dos opressores de gerações que oprimem vocês. E devolveremos para vocês. O povo.
– “Gotham é de vocês. Ninguém vai interferir”Cena que retrata um momento um tanto quanto contraditório do Caos (Bane), este afirma que Gotham será libertada e paralelamente o acionamento da contagem regressiva da bomba vai sendo mostrado.
A ascensão (Rises) de Bruce Wayne/Batman da prisão mostra a ordem iniciando sua retomada pelo poder. Os policiais são libertados do subterrâneo e emergem em busca da restauração da ordem e da lei. Aos poucos o caos vai sendo derrotado e a ordem reestabelecida ao poder.
Gotham poderá ser reconstruída, poderá se reerguer (Rises) em meio à destruição. Com isso a impressão que fica, no mínimo da opinião de Christopher Nolan, é que realmente existe uma necessidade de mudança visando o bem estar de uma sociedade defasada, porém o uso da força e da violência não sustentaria tais mudanças por muito tempo e que uma transformação pacífica talvez fosse o modo mais viável de trazer melhorias sociais.
– “Chega uma hora crítica, quando as estruturas falham e as regras não servem mais de arma e viram correntes que deixam o mal prosseguir”. Comissário Gordon.

Debate Estético

Os críticos de Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge basearam seus comentários na análise do roteiro. Em geral muitas críticas negativas foram colocadas em relação a conversas consideradas desnecessárias e pobres. Em geral, o final épico, trazido por Nolan para a trilogia de Batman, foi bastante elogiado e considerado à altura de um filme sobre um herói que traz tanto sobre posicionamentos políticos como o Batman.

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