segunda-feira, 2 de maio de 2016

Resenha - Auto da Compadecida do Ariano Suassuna

[Resenha] Auto da Compadecida do Ariano Suassuna
Quem não conhece o Auto da Compadecida? Um clássico do teatro brasileiro que além de ter sua própria minissérie de TV, virou filme para o cinema (mais de um, diga-se de passagem).
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A história se desenrola em torno das trapaças do esperto João Grilo e seu “fiel escudeiro” o atrapalhado Chicó. Grilo engana o seus superiores, o clero, a burguesia, o cangaço e até mesmo o diabo, tamanha são as proporções que seus atos tomam.
Entretanto, mesmo sendo uma peça divertidíssima, de típico humor nordestino, Ariano Suassuna alfineta diversas dimensões sociais, desde a burguesia ao clero.
“Antônio Moraes: Os donos de terras é que perderam hoje em dia o senso de sua autoridade. Veem-se senhores trabalhando em suas terras como qualquer foreiro. Mas comigo as coisas são como antigamente, a velha ociosidade senhorial!
Padre: É o que eu vivo dizendo, do jeito que as coisas vão, é o fim do mundo! (…)” (Pág. 32)
No Auto da Compadecida temos o enterro de um cachorro em latim, o testamento desse mesmo cachorro para um padre, um bispo e um sacristão, o debate de João Grilo com o diabo, um gato que “descome” dinheiro e uma gaita que ressuscita os mortos. Essa é uma obra fruto da tradição popular, das crendices e supertições de um povo irreverente que é o povo do nordeste. Ariano Suassuna soube dosar exatamente cada palavra e cada pingo nos “is”. Com muito humor, Ariano, fala sobre a miséria humana, como avareza, racismo e das desigualdades sociais.
“Reza a lenda que certa vez um crítico teatral abordou Ariano Suassuna e o inquiriu a respeito de alguns episódios do Auto da Compadecida. Disse ele: ‘Como foi que o senhor teve aquela ideia do gato que defeca dinheiro? ’ Ariano respondeu: ‘Eu achei num folheto de cordel. ’ O crítico: ‘E a história da bexiga de sangue da musiquinha que ressuscita a pessoa? ’ Ariano: ‘Tirei de outro folheto.” O outro: “E o cachorro que morre e deixa dinheiro para fazer o enterro? ’ Ariano: ‘Aquilo ali é do folheto, também. ’ O sujeito impacientou-se e disse: ‘Agora danou-se mesmo! Então, o que foi que o senhor escreveu?’ E Ariano: ‘Oxente! Escrevi foi a peça!’” (Pág. 175)

O filme de Guel Arraes

O filme inspirado na obra de Suassuna mescla partes de outras peças do mesmo autor, como O Santo e a Porca e Torturas de um Coração. Um exemplo das diferenças é que no filme, temos Rosinha, interpretada por Virgínia Cavendish, que faz par romântico com Chicó, o que não acontece na peça original (não sei de onde tiram que para uma história ser boa deve haver romance). Mas essas diferenças em nada alteram a essência da história. Pois seja no teatro, no papel, nas telinhas ou nas telonas, a história continua mágica! Sem falar das atuações impecáveis de Matheus Nachtergaele e de Selton Mello, que só abrilhantam ainda mais a obra.
 “Valha-me Nossa Senhora, / Mãe de Deus de Nazaré!
A vaca mansa dá leite, / a braba dá quando quer.
A mansa dá sossegada, / a braba levanta o pé.
Já fui barco, fui navio, / mas hoje sou escaler
Já fui menino, fui homem, / só me falta ser mulher.” 

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